As pessoas Zen são estranhas. Já me disseram isso muitas vezes, mesmo antes de eu dizer que eu era uma pessoa Zen. Meu pensamento retórico sempre foi de comédia: "Bem, de fato somos! "Minha resposta vocal é, na maior parte das vezes, silêncio. Conversar casualmente sobre isso hoje, penso eu, deve ter um tom mais "sério". Não demorou muito para eu criar uma curta lista com as razões de praticantes de Zen serem, de fato, estranhas.
1) Não nos preocupamos muito com normas sociais de etiqueta. A noção do que é socialmente importante é mais uma consequência de querer manter uma autoimagem que é aceitável e encorajada pela sociedade. Precisamos só refletir sobre como normas sociais de 100 anos ( ou 50) estão tão diferentes das normas de hoje para reconhecer que nosso comportamento é programado em nós pela a sociedade. Para uma pessoa Zen, não há desejo, ou necessidade para viver uma vida de um robô. Para nós , para preservar uma "imagem aceitável para a sociedade" não vai muito além de vestir roupas limpas e tratar com respeito, dignidade e gentileza os outros. Na questão de " o que é próprio socialmente" , o que resume "normas" sociais, somos lobos solitários. Estamos aptos a falar o que pensamos sobre quase todos os assuntos que forem apresentados pela circunstancia ou necessidade. Apropriado, para nós, significa "baseado nas nossas normas", que são ditadas pelo Dharma, não tem interesse próprio. Isso significa que algumas vezes nos apresentamos de forma inapropriada em situações sociais ou ao telefone... Mesmo por e-mails. Algumas pessoas, eu imagino, podem considerar isso um erro ou atrevido. Para nós, somos só honestos e diretos.
2) Nós "marchamos em um tom diferente". Uma pessoa Zen é tocada pela voz interior, um pensamento altruísta que mantém os pesos e contrapesos necessários de nossas ações, o que vê ' o todo' e não se preocupa com auto- interesse mesquinho. Em vez de agir com linhas emocionais, nossas ações são governadas pela Lei Natural, ou Dharma. Se alguém grita conosco, nós ficaremos mais preocupados por elas e nos perguntaremos a causa que as levou a gritar ao invés de gritar em retorno. Estamos em contato com nosso espírito criativo interior, que pode se manifestar com música, arte, literatura, ciência... Ou simplesmente nossos pensamentos internos. Estamos livres para nos expressar de acordo com nossa sensibilidade.
3) Não temos o costume de mostrar nossas emoções. Todos têm emoções, mas as pessoas Zen são menos susceptíveis a agir por elas- por exemplo, podemos mostrar uma expressão sem emoção quando as pessoas esperam nos ver com raiva, felizes ou tristes. A mente Zen é treinada para observar as emoções deixando-as passar tão facilmente e tão rapidamente quanto elas apareçam. Quando emoções não têm poder, elas não podem ser projetadas sobre os outros, ou refletidas de volta para nós e não causa dana a ninguém. Não levantaremos nossas vozes de raiva ou retaliação ou mesmo agiremos vingativamente.
4) Queremos olhar o todo e não se deter com "coisas fúteis". Eu sempre gostei da expressão atribuída a Sócrates: “Não chore pelo leite derramado". Ela expressa bem a ideia que não há motivo para chorar por coisas vãs. Qualquer um já teve filhos já viu seu filho derramar leites no chão, ou neles mesmos e então ficar de mau humor por muito tempo. Ainda assim mesmo adultos - chegamos da quitanda e notamos que esquecemos algo como leite e ovos, duas das mais importantes que fomos pegar primeiro. Nós nos batemos e nos sentimos mal. Usamos água sanitária para lavar algo e acidentalmente derramamos na camisa que estamos usando , ou quando amassamos o carro enquanto colocamos na garagem, ou quando perdemos o emprego ou alguém passa na grama com o carro, ou esquecemos de trancar a bike e ela é roubada...como deixamos coisas pequena nos perturbar! Nenhuma dessas coisas tem um efeito duradouro sobre nós, ou devem interferir em nossa alegria. Com uma perspectiva universal impressionante, todas são coisas de consequência trivial. Precisamos refletir sobre as situações trágicas que muitas pessoas no mundo para entender como tal atenção que damos a "coisas" triviais acabam por refletir nosso conceito real. Considerar, por exemplo, que mais da metade do mundo- mais de três bilhões- vivem com menos de $2,50 por dia. E de acordo com a UNICEF, 22.000 crianças morrem a cada dia por causa da pobreza. E eles "morrem nas vilas mais pobres do mundo, longe da inspeção e da consciência do mundo. Ser humilde e fraco na vida leva essas multidões a tornarem-se invisíveis na morte". Porque, em face de tão severo sofrimento que muitos vivem, podemos nos considerar miseráveis quando temos luxo e segurança? (Eu, claro, assumo que qualquer um que possa ler esse texto em um computador se encaixa nessa categoria.) A pessoa Zen parece feliz e contente quando os outros acham que ela não tem razão para ser.
5) Sabemos que não estamos no controle das coisas. Muitas coisas que nos acontecem estão fora de nosso controle. A Terra gira sem permissão ou guia e não é assim com muitas coisas? Ficar com raiva do que nos acontece é ficar com raiva do universo por brilhar estrelas sobre nós. As coisas acontecem e ponto. Quando ficamos com raiva ou tristes, esses sentimentos ocorrem, pois não entendemos causa e efeito--pois não reconhecemos que a natureza de (Tathata). Não há motivo para nos envolver com coisas que não têm envolvimento familiar conosco. Tudo tem a ver com causa e efeito: carma. Quando entendemos os antecedentes de uma ação, entendemos a ação e vemos que não é nada contrário e sim o efeito de uma causa antecedente. Reconhecemos que é a natureza de todas as coisas. Quando passamos a ser observadores, ao invés de participantes, tudo fica claro. Para os outros, nós podemos, como observadores, parecer desapegados do mundo. O que as pessoas não entendem é que nós estamos intimamente ligados com isso: não mais olhamos de fora e sim de dentro para fora.
6) Não julgamos os outros mais do que nós nos julgamos- procuramos entender os outros assim como a nós mesmos. Uma vez que escapamos das restrições de uma auto-imagem pessoal, reconhecemos que todos estão "no mesmo barco". Todos sentimos de muitas formas a dor e o sofrimento- psicológico, social, físico e emocional. Nós lutamos para lidar da melhor forma com as durezas da vida e todos procuram passar o tempo fazendo coisas agradáveis para fugir da dor. Quando somos insultados, reconhecemos que o ódio é a manifestação do sofrimento. Nossa resposta não é de reprovação, mas de compaixão. Refletindo dessa forma, não nos envolvemos em brigas ou insultos ou abuso que sejam auto degradantes. Todos nós experimentamos momentos nos quais somos tratados de forma errada e que fez nosso sangue subir. Mas quando passamos o tempo pensando na fonte dessas emoções, nós passamos a entendê-la: com o nosso entendimento vem à compaixão e nossas reações ao ódio, xingamento e ações de raiva contra nós não são pessoais. Parecemos passivos e quietos.
Poderia continuar, mas o ponto é que nós pessoas Zen somos provavelmente diferentes dos outros em relação ao que é estranho. Por quê? Nós passamos muito tempo contemplando as coisas. Isso muda nossas mentes, nossas perspectivas, nosso entendimento sobre nós mesmos e o mundo no qual vivemos. Nossas reações subsequentes podem parecer estranhas e incompreensíveis para as pessoas que não são do caminho místico zen. Mas para alguns de nós, estranheza é parte envolvente de uma vida mística também. Para ser diferente do que somos e o que queremos que os outros pensem de nós nos dá um direcionamento para nossas vidas espirituais. Quando há uma vontade de sair das normas sociais e culturais, para nos livrar de comportamentos que sejam programados e condicionados, o resultado dessa transformação nos ajudam a não sermos reconhecidos pelas pessoas ao nosso redor. E é inevitável um desentendimento por muitos que não estão nessa jornada.
Eu pensei que iria acabar por aqui, mas refletindo melhor eu acho que é justo enfatizar que os praticantes de Zen são de muitos tipos e não é justo para eu categorizar todos da mesma forma. Por acaso, o retrato que descrevi é de um arquétipo Zen ou de um adepto do Zen. Mas nós pessoas Zen no geral podem descrever o caminho de vários níveis. Zen é difícil de colocar em palavras e geralmente quando tentamos fazê-lo erramos feio. Mas espero ter mostrado aos que não seguem o Zen, por meio desse discurso, algumas experiências que nós vivemos quando estamos no caminho Zen- ambos os efeitos que têm sobre nós, quanto os efeitos nos outros. Não podemos desconsiderar como os outros nos olham, pois não são irrelevantes ou sem justificação. A pessoa Zen olha o todo: vê as rachaduras no cimento, a abelha na flor... Nós reconhecemos que tudo afeta tudo e que nós somos meramente componentes da Grande Máquina que é o universo.
Uma nota pessoal: eu acredito que uma vez que consigamos autoconhecimento, o conhecimento da Lei Universal, ou Dharma, nós não temos outro caminho a não ser viver nossas vidas dessa forma que serve para nos melhorar como espécie no mundo e mesmo no universo. Para alguns, nossas reações parecem loucas e como fez Mahatma Gandhi quando pensava na independência da Índia da Grã-Bretanha no começo do século 20, em caminhos extremos, ou Siddhartha, quando jejuou por meses para entender qual era a Verdade Universal. Ambos estavam preparados para dar suas vidas para liderarem o Caminho Nobre- um caminho cujo valor era maior do que o do ser individual. Santos ou loucos? Muitos vêm isso de uma forma e outros de outra forma. Mas nossa percepção fica clara somente quando nossas mentes permitem isso. Quando nossas mentes estão tomadas pelo interesse próprio, bagagem emocional do passado, julgamentos, críticas e etc, quanto nós realmente percebemos de nossa realidade pessoal? Enquanto pessoas Zen podem ser facilmente julgadas, é o Ser que nos guia, e sua voz, para nós, é a única coisa que conta.